Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor
Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor é um retrato de realidades vividas em muitas comunidades onde a religião, que deveria acolher, acaba impondo mais medo. É difícil aceitar que em ambientes de culto e espiritualidade exista também espaço para o julgamento, a negligência e a pressão sobre quem já está fragilizada. As mulheres que sofrem violência dentro de casa e encontram nas igrejas apenas cobrança e não apoio são vítimas duas vezes. Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor, a fé se torna um fardo em vez de abrigo.
Muitas dessas mulheres vivem conflitos internos profundos. De um lado, enfrentam agressões físicas ou psicológicas. Do outro, são pressionadas a manter a aparência de família perfeita, a rezar mais, a acreditar que a culpa pode ser delas. Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor, as palavras que deveriam curar se transformam em exigências que machucam. Ao invés de receber ajuda, ouvem que devem suportar, ter mais paciência ou que falta a elas confiança suficiente naquilo que acreditam.
Há ainda o peso de uma teologia distorcida, que muitas vezes reforça o papel de submissão como virtude. Isso enfraquece qualquer tentativa de reação. Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor, torna-se quase impossível denunciar, pois a denúncia pode significar também ruptura com a própria identidade religiosa. Esse tipo de cultura não protege a fé, apenas silencia o sofrimento e afasta quem mais precisa de cuidado e empatia naquele momento tão vulnerável.
O ambiente espiritual deveria ser o primeiro a acolher quem sofre. No entanto, o que se vê é o contrário em muitos contextos. Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor, o espaço sagrado se torna um palco de julgamento e abandono. As mulheres acabam aprisionadas entre a vergonha e o medo, sem saber se estão pecando ao pedir socorro. Isso faz com que muitas continuem presas a relacionamentos abusivos, acreditando que devem suportar caladas para manter sua fidelidade.
Esse padrão de resposta das lideranças e das comunidades religiosas também é reflexo de uma cultura mais ampla que normaliza o sofrimento feminino. Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor, expõe uma cadeia de omissões. Não se trata apenas de religião, mas de estruturas sociais que se aproveitam da fé para manter o controle. Enquanto isso, as vítimas seguem invisíveis, sem canais de acolhimento, tratamento ou justiça, muitas vezes sendo aconselhadas a perdoar seus agressores sem nenhuma reparação.
É preciso romper com essa lógica que mistura espiritualidade com submissão obrigatória. Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor, o que está sendo ensinado é que a mulher deve aguentar tudo em nome de um ideal de fé que não contempla sua dignidade. Para haver mudança real, é essencial que comunidades religiosas revisem suas práticas, capacitem suas lideranças e, acima de tudo, ouçam com compaixão e responsabilidade. Não se trata de destruir crenças, mas de evitar que elas sejam usadas como armas.
As consequências de não agir são sérias. Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor, há vidas em risco, tanto física quanto emocionalmente. O silêncio imposto mata aos poucos a esperança de uma vida melhor. Por isso, cada espaço de fé precisa se tornar também um espaço de escuta, amparo e ação. Não basta pregar sobre amor se ele não é praticado quando mais necessário. É nas horas difíceis que a fé deve se mostrar viva, atuante e humana.
A responsabilidade de mudar essa realidade não é apenas das igrejas, mas da sociedade como um todo. Quando o silêncio da fé grita mais alto que a dor, o que se perde é a confiança nas instituições que deveriam proteger. Criar pontes entre espiritualidade, justiça social e proteção é urgente. Cada mulher que sofre em silêncio precisa saber que há saída, que seu valor não está em sofrer calada, mas em existir com dignidade. E isso só será possível quando fé e liberdade caminharem lado a lado.
Autor: Oleg Vasilenko